BioNOW! #47 – Prelúdio de uma futura cura do VIH

Por Maria João Cabaço em

BioNOW! #47 - Prelúdio de uma futura cura do VIH

Além da paixão pela música, Freddy Mercury e António Variações foram dois ícones que partilharam um mesmo fim trágico. Ambos viram a sua vida culminar depois de uma infeção com o VIH. Embora as suas canções perdurem e continuem a soar como bandas sonoras das nossas vidas, o ritmo das batidas dos corações de 36 milhões de pessoas tornaram-se ecos de uma pandemia que ainda hoje tem as suas repercussões.

Descoberto nos anos 80, o Vírus da Imunodeficiência Humana imediatamente catapultou e agravou estigmas, que levaram a discriminação infundada e fez com que muitos acreditassem que este era mais um vírus com que tínhamos de aprender a conviver para sempre. Mas será que o VIH veio mesmo para ficar?

Após décadas de estudo e investigação, em que além do próprio vírus, foi também necessário combater o rótulo que erradamente lhe foi colocado, a esperança de desenvolver uma cura nunca se desvaneceu por completo. Cada descoberta científica era um passo mais próximo do tão ambicionado “Santo Graal”.  Em 2008, o mundo testemunhou o caso do “Paciente de Berlim”, o primeiro homem na história a ser curado do VIH. Em 2019, o feito repetiu-se com o “Paciente de Londres”. Agora, em fevereiro de 2022, em Nova Iorque, a primeira mulher foi curada. Mas o que torna o caso desta terceira paciente tão relevante e promissor quanto a uma futura cura?

Os seus médicos apresentaram o caso na “Conferência sobre Retrovírus e Infeções Oportunistas”, onde revelaram que, cinco anos após ser diagnosticada com VIH, foi-lhe detetada leucemia, o que fez com que se tornasse apta para receber um transplante de células estaminais, em 2017. Tal consistiu em duas transfusões de sangue: uma de um adulto, com quem tinha uma relação de parentesco, e outra de sangue do cordão umbilical de um recém-nascido. Este último era um dador parcialmente compatível e apresentava uma mutação no gene CCR5, que confere uma certa resistência à infeção pelo vírus. Em 2020, foi-lhe interrompido o tratamento e, nos meses que se seguiram, não foi detetado qualquer sinal do vírus e, atualmente, o cancro está em remissão há mais de 4 anos.

Os outros dois pacientes curados com sucesso sofriam também de cancro e foram tratados com transplantes de células estaminais de medula óssea, com mutação no gene CCR5. No entanto, este tipo de transplante não é tão acessível e leva a efeitos secundários graves, como a doença do enxerto contra o hospedeiro, que se verificou em ambos os casos. O facto de o transplante com o cordão umbilical, parcialmente compatível, ter impedido que o mesmo se observasse na terceira paciente e que esta se tratasse de uma mulher multirracial, alavancou as esperanças para o tratamento e cura de pacientes com cancro e VIH das mais diversas origens.

Este caso torna-se assim num marco histórico e revolucionário, uma vez que o tratamento com células estaminais do cordão umbilical apresentou os elementos-chave para que uma potencial cura seja alcançada e eficaz para qualquer pessoa.

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