BioNOW! #67 – Biologia sintética e moda sustentável: Uma aranha, um mexilhão e uma bactéria entram numa loja de roupa…

Por Ana Pinto em

BioNOW! #67 - Biologia sintética e moda sustentável: Uma aranha, um mexilhão e uma bactéria entram numa loja de roupa…

… E têm uma ideia de negócio.

Numa indústria que produz 100 biliões de peças e gera 92 milhões de toneladas de resíduos anualmente, e que é responsável por 10% das emissões globais de carbono, é extremamente crítica a criação de soluções que, para além de sustentáveis, consigam competir num mercado exigente e aparentemente insaciável.

Há muito tempo que a seda das teias de aranha tem vindo a intrigar a ciência. Trata-se de um material mais forte que o aço (se compactado a diâmetros comparáveis), mas extremamente leve e flexível. Em 2018, Zhang, um professor da Universidade de St. Louis, e a sua equipa, descobriram uma forma de produzir seda de teia recombinante, usando… adivinhe-se… bactérias.

No entanto, um desafio tinha ainda ficado por resolver: as propriedades mecânicas da seda de aranha devem-se a proteínas com uma enorme e repetitiva sequência monomérica, algo que é bastante difícil colocar bactérias de rápido metabolismo e crescimento a produzir com um rendimento satisfatório.

A ideia para resolver este problema surgiu de outro projeto da mesma equipa. Ora, os mexilhões secretam proteínas especializadas adesivas no seu pé, ao qual se podem agarrar outros organismos. Zhang e os seus colaboradores usam bactérias recombinantes para produzir estas proteínas, adaptando-as como adesivos para aplicações biomédicas. Decidiu-se então explorar, além das propriedades adesivas, as propriedades coesivas destas proteínas. Ao colocá-las nas extremidades das sequências proteicas da seda produzida pelas bactérias, verificou-se que as proteínas de pé de mexilhão promoveram a interação molecular, deixando de ser necessárias sequências repetitivas tão grandes.

O resultado desta fusão genética foi novas proteínas de fusão de seda de aranha, as btMSilks1, que, além de constituírem um material mais forte (pelo menos duas vezes) do que a seda recombinante inicial, representam um aumento de rendimento de oito vezes, chegando a 8 gramas de material fibroso por cada litro de cultura de bactérias. Este output é já suficiente para testar em produtos reais.

Isto significa um salto impossível de ignorar na substituição de materiais fibrosos derivados do petróleo, como nylon e poliéster, por materiais da biologia sintética. Estes últimos, para além de renováveis, biodegradáveis e de produção barata (usando bactérias), são muito mais versáteis, uma qualidade essencial num mercado tão exigente e especializado como o da moda. Andarmos vestidos de teias de aranha; não será um futuro promissor?

1 bi-terminal Mfp fused silks

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