BioNOW! #4 – Neuropróteses: um novo quotidiano para pacientes com paralisia severa
Por Eduardo Carvalho em

BioNOW! #4 – Neuropróteses: um novo quotidiano para pacientes com paralisia severa
As doenças do neurónio motor são um conjunto de condições neurodegenerativas que afetam seletivamente os neurónios motores e que, por conseguinte, perturbam a atividade muscular voluntária. Entre elas a mais comum é a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) afetando todos os anos cerca de 2 em cada 100 mil habitantes nos países desenvolvidos.
Phil O’Keefe, um australiano sexagenário, foi diagnosticado com ELA em 2015. Este marcante acontecimento é acompanhado, geralmente, por uma rápida e perniciosa transformação na vida do diagnosticado como também na daqueles que lhes são mais próximos, não fosse a reduzida esperança média de sobrevivência pós-diagnóstico. Infelizmente, e apesar de notáveis esforços de consciencialização pública como o viral Desafio do Balde de Gelo (mais conhecido por Ice Bucket Challenge), a enfermidade do astrofísico Stephen Hawking continua sem conhecer uma cura. Não obstante as difíceis perspetivas, a sorte do australiano mudou radicalmente quando, em abril, cientistas da Universidade de Melbourne inseriram um dispositivo, através de vasos do pescoço e do tamanho de um clipe, junto ao seu córtex motor.

Figura 1 – Sistema neuroprostético motor endovascular. O dispositivo é inserido no seio sagital superior, adjacente ao giro pré-central. A região destacada a amarelo representa a ativação do córtex motor primário que ocorre ao pensar no movimento corporal. O elétrodo de transmissão está ligado através da veia jugular interna à unidade interna de telemetria (ITU) localizada abaixo da clavícula. A unidade de telemetria externa (ETU) recebe os sinais de electrocorticografia através de transmissão de infravermelhos. O sinal é enviado para um descodificador que o traduz em ações, que juntamente com o rastreamento de movimento ocular, permite o controlo de um sistema operacional como o Windows 10.
Este dispositivo liga-se, via tecnologia sem fios, a um computador e permite converter sinais elétricos motores em comandos definidos, que aliados ao rastreamento de movimento ocular, conseguem controlar o cursor no ecrã e não só. Tal como todas as Interfaces Cérebro-Máquina, o procedimento requer inicialmente um período de treino em que algoritmos de aprendizagem automática leem sinais de electrocorticografia associados a diversos movimentos corporais e constroem um modelo que se adeque ao paciente. Todavia, o que diferencia esta interface das antecedentes é que, ultrapassada esta etapa, os pacientes conseguem utilizá-la de forma eficiente e independente no conforto das suas casas.
Ainda que sejam necessários mais participantes e estudos de médio e longo prazo, tendo em conta o impacto que esta tecnologia pode ter na qualidade de vida destas pessoas, o grupo de investigadores já começou a planear a sua comercialização. A partir do momento em que ações rotineiras como mandar uma mensagem ou fazer uma chamada constituem vislumbres de uma normalidade tão desejada por milhares de indivíduos, percebemos que esta iniciativa acarreta indubitavelmente um sentimento de esperança num novo quotidiano.
Sabe mais em:
https://jnis.bmj.com/content/early/2020/10/30/neurintsurg-2020-016862