BioNOW! #60 - Cicatrizes Emocionais: O impacto do Trauma Social no cérebro
Com a crescente consciencialização da saúde mental, é já vastamente sabido que experiências sociais profundamente negativas podem ter efeitos marcantes e duradouros na personalidade e comportamento humanos. Na verdade, estudos indicam que cerca de 80% das pessoas na Europa já experienciaram algum tipo de experiência traumática e que cerca de 6% das pessoas, a nível mundial, experienciarão casos de Stress Pós-traumático (PTSD) ao longo da sua vida. No entanto, este trata-se de um problema de difícil emenda, dado que a medicina não encontrou ainda métodos absolutos para abordar situações de foro psicológico.
Neste enquadramento, um grupo de investigadores da Brain and Body Research Center at Mount Sinai, em Nova Iorque, realizou um estudo em ratos sobre os mecanismos neuronais que são despoletados como consequência de eventos sociais traumáticos. Assim, foi avaliada a ativação ou inibição de regiões do cérebro associadas a estímulos sociais gratificantes e a sua variação antes, durante e após eventos de trauma social.
Nesta investigação, os ratinhos avaliados foram colocados numa jaula na qual se encontrava um rato considerado agressivo (embora estivessem separados por uma barreira transparente, de modo a não haver agressão física), de modo a simular situações de trauma social. Ao estar sujeitos a interações sociais frustradas, devido à agressividade demonstrada pelo outro rato, alguns dos animais em estudo desenvolveram “chronic social defeat stress”, uma condição de stress social análoga à depressão e ansiedade humanas. Esta condição era identificada posteriormente ao submeter as cobaias a contacto com ratos juvenis, com o qual, tipicamente, há uma predisposição para interações sociais positivas. Deste modo, quando, após os períodos de contacto negativo, os ratos mostravam uma inibição social, estes eram considerados como suscetíveis (a desenvolver “chronic social defeat stress”), sendo considerados como resilientes no caso contrário.
Após a avaliação comportamental, foi estudado, através de técnicas avançadas de imagiologia neurológica, se os casos de “chronic social defeat stress” estavam associados a regiões neuronais específicas. Efetivamente, os investigadores identificaram uma população de neurónios responsiva a ameaças – lateral septum neurotensin (NTLS) neurons – que era ativada nos ratos considerados suscetíveis, mesmo nos casos de interações sociais normais. Ou seja, verificou-se haver, de facto, uma prevalência neurológica do trauma social.
Posteriormente, ao estudar as interações desses neurónios NTLS com a restante rede neuronal, a equipa de investigadores identificou que estes inibem regiões cerebrais que codificam para sensações de recompensa/prazer social. Numa fase final, através de técnicas de optogenética, que consiste na modificação genética de neurónios para que respondam a estímulos luminosos, os investigadores conseguiram ativar ou inibir os neurónios NTLS de modo a controlar o impacto dos eventos traumáticos nos animais estudados.

Figura 1 – Esquema do princípio da optogenética
Este estudo abre portas para uma compreensão mais tangível de problemas de foro psicológico, como é o caso do Stress Pós-Traumático (PTSD). Para este grupo, o próximo passo é estudar, desta vez em humanos, os neurónios identificados nos ratos com trauma social. Identificar com precisão os circuitos neuronais responsáveis por este tipo de condições psicológicas seria um grande passo a favor da saúde mental. Com a ciência do nosso lado, espera-nos um futuro risonho! 🙂