BioNOW! #61 – O elefante na sala: picky eaters a travar o aquecimento global?

Por Ana Pinto em

BioNOW! #61 - O elefante na sala: picky eaters a travar o aquecimento global?

Nunca deixaremos de libertar dióxido de carbono. É inevitável. Ainda assim, a pegada carbónica humana pode tornar-se quase nula, se reduzirmos a produção ao mínimo e aprendermos a armazenar carbono atmosférico eficazmente no estado sólido. Felizmente, a máquina que o faz de modo mais eficiente e há mais tempo não precisou de ser inventada por nós. Num ano, uma árvore adulta fixa, em média, 22 kg de dióxido de carbono.

No entanto, naturalmente, as espécies de árvores diferem em capacidade de armazenamento. Comummente designamos por “madeira pesada” e por “madeira leve” as espécies que apresentam alta e baixa densidade carbónica, respetivamente. As árvores de madeira pesada, como o carvalho, são as mais eficazes na fixação de carbono atmosférico, mas têm um crescimento lento. Por outro lado, as árvores de baixa densidade carbónica, tais como o pinheiro e outras coníferas, crescem mais rapidamente, e numa floresta elevam-se acima das outras plantas na tentativa de se exporem à luz solar.

Nas florestas tropicais africanas, há uma equipa de jardineiros voluntários a trabalhar para selecionar a diversidade de árvores do modo mais conveniente. É no trabalho destes jardineiros que incide o estudo de Stephen Blake, Ph.D., professor na Universidade de Saint Louis, de Fabio Berzaghi, investigador no Laboratório do Clima e das Ciências Ambientais (LSCE) em França, e colegas. Este estudo cobre mais de 800 espécies de plantas, com dados nutricionais para 145 delas.

Descobriu-se que, ironicamente, as árvores de baixa densidade carbónica são as mais saborosas e nutritivas para os elefantes, que se alimentam preferencialmente delas. Ora, os elefantes não se limitam a debicar as folhas, mas arrancam ramos inteiros ou mesmo raízes, provocando estragos significativos. Isto desbasta a floresta das “ervas daninhas” de madeira leve e rápido crescimento, reduzindo a competição entre as árvores pelo solo, nutrientes e luz solar, e favorecendo o crescimento das espécies mais desejadas, de alta densidade carbónica.

Embora a madeira destas árvores não seja apreciada pelos elefantes, os seus frutos frequentemente são. As sementes destes frutos passam pelo sistema digestivo destes animais sem sofrer qualquer dano, e são dispersas por outros lugares da floresta quando libertas nas fezes, germinando em novas árvores de grande porte.

Através daquilo que lhes é mais natural – comer – os elefantes são capazes de manipular em grande escala a biodiversidade das florestas em que vivem. São, assim, mais um fator influenciador dos níveis de carbono na atmosfera

Apesar disto, não deixam de ser animais criticamente ameaçados, continuando ativa a sua caça ilegal e tráfico. Números que um dia foram 10 milhões estão agora reduzidos a 500 000, em grupos dispersos pelo continente africano. Se se extinguirem, além de várias outras repercussões, a floresta tropical da África central e ocidental perderá parte da sua capacidade de reter carbono atmosférico. No entanto, se bem-sucedida, a conservação dos elefantes contribuirá para a mitigação do aquecimento global. Será uma escolha difícil e ambígua, ou será apenas preciso chamar a atenção para o elefante na sala?

Categorias: BioNOW!